Então,
talvez o mais difícil seja
estar exactamente no mesmo sítio onde estava há um ano e ter absoluta certeza
disso, que estou exactamente no mesmo sítio onde estava há um ano. E talvez o
mais fácil seja saber que prefiro estar aqui do que noutro lado qualquer, mesmo
que esse aqui seja mais frio do que quando Tchékov escrevia,
– tenho frio.
Acho que não sou uma
pessoa complicada, contento-me com pouco desde que goste desse pouco. A maior
parte das mulheres que foi para a cama comigo chama-me filho da puta e não me
parece que queiram ofender a minha mãe. Há quem me defenda, quem diga que sou
bem intencionado e que não quero o mal de ninguém. Claro que as que me chamam
filho da puta não concordam, dizem que sou indiferente, distante, que só quero
ir para a cama com elas e que nem sou capaz de lhes dar um beijo quando se vão
embora, que as trato como lixo, que as trato como se fossem putas – houve
outro dia uma que disse isso, que se ela fosse puta eu a tratava melhor – que
de vez em quando até lhes dou cinco euros para o táxi,
– como se cinco euros desse
para o táxi,
porque não me apetece levá-las
a casa nem me apetece que elas durmam ao meu lado. Mas eu não tenho culpa disso, acho que elas te
deviam culpar a ti. Acho que elas te deviam culpar pelos cinco euros para o
táxi e pela indiferença com que as trato, porque na verdade quando lhes digo,
– já te ias embora,
ou,
– desaparece daqui,
é em ti que estou a
pensar. Quando lhes digo isso sou eu apenas a pensar que mais vale estar só do
que estar sem ti, que mais vale ser eu a sonhar contigo do que tê-las a dormir
ao meu lado.
E assim a minha vida é
tudo aquilo que eu queria quando eu era novo, e assim a minha vida é tudo
aquilo que eu não quero agora que começo a envelhecer.
Mas há quem diga bem de mim.
Ainda ontem, por exemplo, uma rapariga disse para outras duas,
– olha, o nosso Miguel,
mesmo sabendo que eu não
sou de nenhuma delas, até me perguntou por ti. Como o Bruno, hoje, me perguntou.
– como é que estão as
coisas com ela?,
e eu disse que estão da
mesma maneira como sempre estiveram, estão
da mesma maneira que estavam há dias e meses e anos e séculos e milénios, porque
não sei
se calhar já vivemos isto.
Tenho essa sensação, a de que já vivemos isto, que somos uma repetição.
Eu disse que as coisas estão
como estão, na mesma, comigo a deitar-me tarde e com ela a levantar-se cedo,
porque as coisas são mesmo assim, porque às vezes o mais difícil não é aceitar o
que acontece, às vezes o mais difícil é mesmo viver o que não acontece,
disse eu.
E é isso, meu amor. Vou
vivendo assim, sem ti.
quando for grande quero escrever assim!
ResponderEliminarobrigado.
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